A queda dos juros nos Estados Unidos e o recuo da Selic no Brasil ao mesmo tempo será “uma combinação muito poderosa” para os ativos brasileiros no próximo ano, avalia a XP, que vê fatores locais ganhando peso na dinâmica do mercado brasileiro em 2026, após o cenário global sustentar uma performance robusta este ano.
“Nós acreditamos que os fatores domésticos vão começar a fazer mais preço no mercado. E os dois principais fatores são juros e eleições”, afirmou o estrategista-chefe e head de research do grupo, Fernando Ferreira, em entrevista à Reuters.
No caso da política monetária, a XP trabalha com uma primeira queda da taxa básica de juros em março, terminando o ano que vem em 12%, contra os atuais 15% ao ano. Mas, em caso de um desfecho diferente, vê mais chance do Banco Central antecipar o corte para janeiro do que adiar para abril.
De fato, afirmou Ferreira, o BC tem adotado um discurso mais duro recentemente, mas essa atitude faz parte da comunicação do BC para controlar a expectativa de inflação.
Ele citou que a combinação dos dados de preços recentes com os de atividade já bem mais fracos – e os preços de commodities em reais mais baixos também – mostra que a inflação não deve ser um problema nos próximos seis meses.
“Isso deve abrir espaço para o BC iniciar um ciclo de corte, mesmo com o IPCA ainda acima da meta de 3%. Não acreditamos que o BC vai esperar o IPCA cair a 3% para começar a cortar”, disse, ressaltando é mais relevante que para a bolsa o tamanho do ciclo de cortes do que a data de início do mesmo.
Ferreira avalia que o mercado deve entrar mais no modo de “trade eleitoral” em março ou abril, quando estiver claro quem serão os candidatos. E avalia que o debate fiscal dominará a atenção de investidores, dado o nível de dívida/PIB, próximo a 80%, com trajetória crescente, e um nível de juros elevado.
“Teremos um cenário de reformas e consolidação fiscal ou não? Esse vai ser o grande tema que os investidores vão prestar atenção nas eleições do ano que vem”, afirmou, esperando também uma volatilidade maior nos mercados.
“Na sexta-feira, tivemos um preâmbulo disso”, acrescentou, ao apresentar com a equipe da XP o relatório “Onde Investir em 2026” nesta segunda-feira.
O Ibovespa desabou mais de 4% na última sexta-feira, na maior queda em um dia desde fevereiro de 2021, após o anúncio de que o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) foi escolhido pelo pai para ser candidato a presidente da República em 2026, o que, para alguns agentes, adiciona incerteza política.
Na entrevista à Reuters, Ferreira não descartou, contudo, um aumento no interesse em ativos de risco. “A bolsa volta mais para o radar dos investidores na medida em que os juros caiam no Brasil e há o cenário de eleições, de maior volatilidade”, afirmou o estrategista.
Na semana passada, a XP elevou seu valor justo para o Ibovespa a 185 mil pontos no final de 2026.
Exterior ainda favorável
O cenário externo deve continuar muito favorável para mercados emergentes e reverberar nos ativos brasileiros, de acordo com Ferreira.
Ele citou que a perspectiva é de uma política fiscal expansionista nos Estados Unidos no próximo ano, bem como continuidade de queda dos juros norte-americanos, o que deve manter a tendência de dólar fraco, algo muito positivo para mercados emergentes.
O estrategista destacou o possível anúncio do novo chair do Federal Reserve, com as apostas no mercado colocando maior probabilidade em Kevin Hassett, que tem um viés mais “dovish”. Isso, acrescentou, pode deixar o Fed no ano que vem um pouco mais leniente com a inflação, forçando os juros mais para baixo.
“Esse cenário de emergentes em alta, não acredito que seja um cenário de um ano apenas, que foi só em 2025 e acabou”, afirmou. “Esse trade de emergentes pode até acelerar no ano que vem com essa combinação de fiscal e monetário mais expansionista nos Estados Unidos.”
“E o Brasil pode se sobressair em relação a outros mercados, porque seremos um dos poucos emergentes que vão cortar juros no ano que vem”, afirmou, classificando como “muito poderosa” a combinação de queda de taxa de juros nos Estados Unidos com recuo da Selic no Brasil ao mesmo tempo.
Um começo
Para o estrategista-chefe da XP, 2026 deve mostrar o começo de um movimento de rotação para ativos de risco, conforme investidores começam a olhar a performance do CDI em 2025 em relação a outras opções, como Ibovespa, que acumula uma valorização de mais de 30% no ano.
“Mas para o dinheiro de verdade voltar, precisamos ver a Selic a um dígito. Ou pelo menos abaixo de 10%. Uma taxa de 1% ao mês na renda fixa ainda é bastante poderosa como efeito psicológico para os investidores”, pontuou.
“Não acreditamos que esse movimento (de rotação mais forte) será principalmente em 2026. Ele vai vir mais pra frente, quando os juros de fato caírem mais.”
De acordo com Ferreira, a renda fixa segue como carro-chefe nas carteiras de alocação na XP, que tem aumentado a exposição a outros ativos de risco tem sido elevada ao longo de 2025 e olhando 2026.
“Mesmo num perfil mais agressivo, o percentual de alocação em renda fixa ainda é de 50% das carteiras, dividido entre inflação, pós-fixado e pré-fixado”, afirmou, revelando que, recentemente, aumentaram a exposição a renda variável brasileira, fundos imobiliários, fundos multimercados, entre outros.
“O tema segue sendo diversificação, mas nós estamos guiando as pessoas para não esperarem o CDI começar a cair para daí diversificar (e aumentar o risco)…os ativos antecipam… É óbvio que com juros de 15% a pressa para mudar é bem menor, mas é algo que estamos mostrando”, reforçou.