A nova fase da Operação Sem Desconto, conduzida pela PF (Polícia Federal) e pela CGU (Controladoria-Geral da União) na quinta-feira (13), revelou um esquema milionário de pagamento de propinas a autoridades.
Segundo as investigações, a Conafer (Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais) — uma das entidades associativas envolvidas nas fraudes na Previdência Social — desviou ao menos R$ 640 milhões recebidos do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Foram cumpridos 63 mandados de busca e apreensão e medidas cautelares diversas da prisão em 14 estados e no Distrito Federal. Além disso, a ação de ontem resultou nas prisões de ao menos oito pessoas:
- Alessandro Stefanutto, ex-presidente do INSS na gestão Lula (PT);
- André Paulo Félix Fidelis, ex-diretor do INSS;
- Cícero Marcelino de Souza Santos, empresário;
- Samuel Chrisostomo do Bomfim Junior, contador da Conafer;
- Tiago Abraão Ferreira Lopes, diretor da Conafer e irmão do presidente da Conafer;
- Thaísa Hoffmann Jonasson, médica e empresária;
- Vinicius Ramos da Cruz, cunhado do presidente da Conafer;
- Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, ex-procurador-geral do INSS e esposo de Thaísa Hoffmann.
Na decisão que autorizou a operação de ontem, o ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal) determinou uma nova ordem de prisão preventiva contra o empresário Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”. Ele está preso desde setembro no Complexo da Papuda, em Brasília.
Além desses, o presidente da Conafer, Carlos Roberto Ferreira Lopes, também é alvo de mandado de prisão preventiva. A CNN Brasil tenta confirmar se o mandado foi cumprido.
Ex-presidente do INSS recebia propina de R$ 250 mil por mês
A PF apontou que Alessandro Stefanutto recebia mensalmente R$ 250 mil relacionados a propina entre junho de 2023 e setembro de 2024. De acordo com as investigações, o ex-presidente da autarquia era conhecido como “O Italiano”. Ele receberia as propinas usando empresas de fachada.
A investigação aponta também que Stefanutto “avaliava e aprovava a manutenção dos convênios entre o INSS e a Conafer, mesmo após alertas técnicos sobre inconsistências nas listas de filiados e indícios de falsificação de autorizações de desconto”.
O ex-presidente — diz a PF — também “autorizava o processamento de cadastros de filiação encaminhados pela Conafer, sem observância dos critérios legais e sem checagem da manifestação de vontade dos beneficiários” e “recebia pagamentos mensais provenientes de empresas vinculadas ao operador financeiro (Cícero Marcelino de Souza Santos), disfarçados como honorários de consultoria ou assessoria técnica”.
Ex-procurador do INSS recebeu R$ 6,5 milhões por empresas de fachada
O ex-procurador-geral do INSS Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira recebeu R$ 6,5 milhões em propina entre 2022 e 2024, indica a PF. Os valores chegavam por meio de empresas de fachada controladas por Cícero Marcelino.
É mostrado pela PF, por meio de diálogos interceptados, o uso de codinomes como “Herói V”, “Amigo V” ou “Procurador”, por Cícero e Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Conafer, apontado como líder do esquema, em comunicações internas sobre pagamentos ilícitos.
Ex-diretor do INSS embolsou R$ 3,4 milhões em propinas
O ex-diretor de benefícios do INSS André Fidelis recebeu R$ 3,4 milhões em propinas entre 2023 e 2024, mostram as investigações.
Segundo a PF, Fidelis é “um dos principais servidores públicos envolvidos no esquema criminoso que sustentou a fraude milionária ligada à Conafer” e recebia as quantias por meio de Cícero Marcelino.
A PF destaca que Fidelis — identificado como “Herói A” nas mensagens interceptadas — foi peça essencial para a manutenção do esquema fraudulento entre o INSS e a Conafer, recebendo pagamentos em troca de favorecimento institucional e omissão fiscalizatória.
Deputado teria recebido R$ 14,7 milhões em propinas
Já o deputado federal Euclydes Pettersen (Republicanos-MG) teria recebido R$ 14,7 milhões em propina no esquema.
Segundo a PF, Euclydes é denominado como “Herói E” nas planilhas apreendidas. Consta ainda que ele recebia valores mensais fixos, repassados por meio de empresas controladas por Cícero Marcelino e seu assessor, André Luiz Martins Dias.
A investigação diz que o parlamentar era figura essencial no esquema, porque concedida acesso a Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Conafer.
Ex-ministro de Bolsonaro recebia propina da Conafer
De acordo com a PF, José Carlos Oliveira, ex-ministro do Trabalho e Previdência no governo de Jair Bolsonaro (PL), recebeu propina da Conafer. Por determinação do ministro do STF André Mendonça, Oliveira terá de usar tornozeleira eletrônica.
O relatório produzido pela corporação aponta que o ex-ministro teria auxiliado a entidade a operar um esquema de descontos ilegais contra pensionistas e aposentados quando dirigia a pasta. Os investigadores indicam ainda que Oliveira participou do mesmo esquema quando estava na presidência do INSS.
Ex-secretário da Agricultura recebeu R$ 1 milhão em propina
O ex-secretário de Inovação do Ministério da Agricultura e Pecuária Pedro Alves Corrêa Netto recebeu mais de R$ 1 milhão em propina durante 2022 e 2024 do esquema de corrupção no INSS, de acordo com a PF.
As informações constam na decisão judicial que autorizou a nova fase da Operação Sem Desconto. No documento, o ministro André Mendonça mandou o servidor colocar tornozeleira eletrônica.
As propinas foram recebidas pelo ex-secretário por meio de transferências bancárias realizadas por Cícero Marcelino.
O que diz Alessandro Stefanutto
Em nota logo após a operação ter sido deflagrada, a defesa de Alessandro Stefanutto disse que não teve acesso ao teor da decisão que decretou a prisão do ex-presidente do INSS.
“Trata-se de uma prisão completamente ilegal, uma vez que Stefanutto não tem causado nenhum tipo de embaraço à apuração, colaborando desde o início com o trabalho de investigacao”, diz a defesa.
Segundo a nota, Stefanutto “segue confiante, diante dos fatos, de que comprovará a inocência dele ao final dos procedimentos relacionados ao caso”.
A CNN Brasil entrou em contato com as defesas de Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, Thaísa Hoffmann Jonasson, Euclydes Pettersen e Carlos Roberto Ferreira. Caso haja retorno, esse espaço será atualizado com os posicionamentos.
A CNN Brasil também tenta contato das defesas e Antônio Carlos Camilo Antunes, Pedro Alves Corrêa Netto, Cícero Marcelino, André Fidelis e José Carlos Oliveira.