O acordo na Casa Branca na segunda-feira (18) sobre o próximo passo — uma reunião bilateral entre o líder russo Vladimir Putin e o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky — parecia amplamente unânime. Então veio a resposta russa.
“A ideia discutida foi que seria apropriado estudar a oportunidade de elevar o nível dos representantes dos lados russo e ucraniano”, disse o assessor do Kremlin, Yury Ushakov, em briefing aos repórteres sobre a ligação do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com Putin.
Sem menção a nenhum dos líderes pelo nome, ou qualquer indicação de que os “representantes” poderiam ser elevados a esse nível.
O ministro das Relações Exteriores russo, Sergey Lavrov, adotou um tom mais conciliador em uma entrevista à TV estatal na terça-feira (19). “Não recusamos nenhuma forma de trabalho — nem bilateral nem trilateral”, insistiu.
Mas: “Quaisquer contatos envolvendo altos funcionários devem ser preparados com o máximo cuidado.”
Resistência de Putin em se reunir
Esta é uma guerra que Putin iniciou ao reconhecer unilateralmente uma parte do território ucraniano (as autoproclamadas Repúblicas Populares de Donetsk e Luhansk) como independente.
Ele argumentou que a Ucrânia é “uma parte inalienável da própria história, cultura e espaço espiritual da Rússia”, e a separação de Moscou é um erro histórico.
Então, se essa reunião acontecer — como coloca Orysia Lutsevich, diretora do programa Rússia e Eurásia da Chatham House — Putin “terá que aceitar o fracasso de se sentar com um presidente que ele considera uma piada de um país que não existe”.
Também seria, argumentou ela, uma enorme reversão no tom que seria difícil de explicar ao povo russo.
“(Putin) lavou tanto o cérebro dos russos na televisão estatal, que Zelensky é um nazista, que (a Ucrânia) é um estado fantoche do Ocidente… que Zelensky é ilegítimo, por que ele está de repente falando com ele?”
O Kremlin não apenas questiona rotineiramente a legitimidade do líder ucraniano, fixando-se no adiamento das eleições na Ucrânia, ilegais sob lei marcial, mas em seu último memorando de “paz” exige que a Ucrânia realize eleições antes que qualquer tratado final de paz seja assinado.
Putin e outros funcionários russos raramente se referem a Zelensky pelo nome, preferindo o apelido mordaz de “o regime de Kiev”.
E não esqueçamos que foi Zelensky quem viajou para a Turquia para as primeiras conversas diretas entre os dois lados em meados de maio, apenas para Putin enviar uma delegação liderada por um escritor de livros didáticos de história.
Tatiana Stanovaya, pesquisadora sênior do Carnegie Russia Eurasia Center e fundadora da R.Politik, que fornece notícias e análises sobre a Rússia, argumenta que embora Putin não veja um encontro com Zelensky como crítico em uma guerra que para a Rússia é mais sobre confrontar o Ocidente do que a Ucrânia, ele ainda poderia aceitar a reunião se achasse que seria bem-sucedida.
“As demandas principais devem estar na mesa e Zelensky deve estar ok para falar sobre isso”, ela disse à CNN em uma entrevista na terça-feira (19).
Até agora, Zelensky descartou essas demandas principais, que incluem abdicar do território que a Ucrânia ainda controla. Mas Putin, ela argumentou, vê Trump como a chave para mudar isso.
“Trump é visto como um facilitador da visão russa do acordo e, para isso, espera-se que os Estados Unidos trabalhem com Kiev para pressioná-los a serem mais flexíveis, mais abertos às demandas russas.”
Stanovaya sugeriu que a Rússia pode tentar manter os EUA do seu lado fazendo o que Ushakov sugeriu, e propondo uma nova rodada de conversas em Istambul, mas com uma delegação de nível mais alto, talvez incluindo o próprio Ushakov e o ministro das Relações Exteriores Lavrov.
Mas ele não arriscará uma “emboscada” sentando-se com Zelensky apenas para descobrir que todas as suas demandas foram rejeitadas.
Trump encerrou seu dia na segunda-feira (18) postando no Truth Social que ele “começou os preparativos para uma reunião… entre o presidente Putin e o presidente Zelensky.”
Quando acordou e ligou para o programa matinal da Fox News na terça-feira de manhã, parecia ter percebido que isso não era um acordo fechado.
“Eu meio que organizei isso com Putin e Zelensky, e você sabe, eles são os que têm que dar as cartas. Nós estamos a 7 mil milhas de distância”, declarou ele.
Rússia se vê em vantagem nas negociações
Putin não tem motivo para ceder neste momento. Sem fazer nenhuma concessão, ele foi recompensado com uma grande cúpula no Alasca, o abandono da exigência de Trump de assinar um cessar-fogo antes das negociações de paz, e o desmoronamento de todos os ultimatos de sanções até o momento.
Tendo reduzido ligeiramente a escala de ataques noturnos de drones às cidades ucranianas até agora em agosto, a Rússia os intensificou novamente na noite de segunda-feira, lançando 270 drones e 10 mísseis.
Se a pressão de Trump sobre Zelensky ainda não produziu os resultados que Moscou deseja, sempre há a força militar para recorrer.
O único fator imprevisível para a Rússia neste momento é quem Trump culpará quando este último esforço de paz fracassar.