Um estudo divulgado nesta quarta-feira (19) pelo FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública) apontou as 20 cidades mais violentas da Amazônia Legal. A região é composta por nove estados brasileiros: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.
Segundo o estudo, somente em 2024, mais de oito mil pessoas foram vítimas de MVI (mortes violentas intencionais) nos 772 municípios que compõem a Amazônia Legal, número que representa uma taxa de 27,3 assassinatos para cada 100 mil habitantes da região.
Os dados apontados pela pesquisa mostram e comparam as taxas de mortes violentas intencionais pela quantidade dos municípios da região. Esses portes podem ser classificados como:
- Pequeno I: com população até 20 mil habitantes;
- Pequeno II: com população entre 20 e 50 mil habitantes;
- Médio: com população entre 50 e 100 mil habitantes, e registrou a maior taxa média de mortes violentas intencionais;
- Grande: com população acima de 100 mil habitantes.
Veja as comparações das taxas de MVI por porte dos municípios da Amazônia Legal
A partir dos resultados, o estudo também conseguiu listar as 20 cidades mais violentas da região, ao analisar as taxas de MVI dos últimos três anos, também por porte populacional de cada município.
Comando Vermelho: como surgiu e se espalhou a maior facção do Rio
“As taxas foram calculadas com base nos registros de mortes violentas intencionais dos últimos três anos, tanto para permitir um olhar para as cidades menores, uma vez que os rankings são normalmente calculados somente para municípios com mais de 100 mil habitantes, mas também para evitar que uma cidade constasse entre as mais violentas apenas em razão de um episódio pontual”, afirmou o estudo.
Ao listar as 20 cidades, o estudo também analisou as dinâmicas territoriais, econômicas e criminais de cada município. Veja:
- Vila Bela da Santíssima Trindade (MT): município que apresenta a maior taxa de MVI da Amazônia em 2024, impulsionada, principalmente, pela condição fronteiriça com a Bolívia (rota de tráfico de drogas) e pela intensificação do garimpo ilegal na Terra Indígena Sararé;
- Nobres (MT): a violência na cidade é causada pela presença de facções criminosas, sob influência do Comando Vermelho, registrando homicídios relacionados a disputas entre grupos ou execuções de pessoas por possíveis vínculos com o PCC (Primeiro Comando da Capital);
- Calçoene (AP): município é disputado pelas facções criminosas UCA (União Criminosa do Amapá) e FTA (Família Terror do Amapá), está em uma rota estratégica (BR-156) para o tráfico de drogas, armas e pessoas e é um dos principais focos de garimpo ilegal no Amapá;
- Alto Paraguai (MT): município é dominado pela Tropa do Castelar, uma dissidência do Comando Vermelho, conhecida por episódios de violência;
- Cumaru do Norte (PA): violência está relacionada a conflitos fundiários entre agropecuaristas e populações tradicionais. Além disso, o município abriga parte da Terra Indígena Kayapó, território afetado pelo desmatamento e garimpo;
- Rio Preto da Eva (AM): aumento da violência na cidade nos últimos três anos é atribuído à guerra de facções, mas a redução em 2024 sugere a consolidação da atuação e do monopólio do Comando Vermelho no município;
- Barra do Bugres (MT): posição estratégica próxima a rotas de escoamento de drogas da Bolívia e torna a cidade vulnerável a disputas violentas entre facções criminosas, sendo palco de chacinas;
- Aripuanã (MT): violência acontece por conta da coexistência de garimpo ilegal, tráfico de drogas, facções criminosas e presença de terras indígenas na cidade, onde o Comando Vermelho se consolidou cobrando “impostos” sobre a extração e comercialização do ouro;
- Novo Progresso (PA): passa pela BR-163, com conflitos fundiários, índices de desmatamento, garimpo e invasões de terras indígenas;
- Mocajuba (PA): presença do Comando Vermelho e do Bonde 777, dissidente da facção carioca. Além disso, a violência no município está ligada à letalidade policial, em que metade das MVI registradas em 2024 foi provocada por intervenções das polícias;
- São Félix do Xingu (PA): marcado pela histórica e intensa disputa por terra, impulsionada pela pecuária extensiva (maior rebanho bovino do país) e pelo desmatamento ilegal;
- Coari (AM): localização estratégica no Rio Solimões, sendo corredor hidroviário para o escoamento de drogas do Peru e da Colômbia. A violência na cidade acontece, principalmente, em razão das disputas entre PCC e CV;
- Iranduba (AM): presença da facção Comando Vermelho, além de crimes ambientais, como desmatamento e queimadas, e conflitos fundiários;
- Tabatinga (AM): localizada na tríplice fronteira (Brasil, Peru e Colômbia), a cidade é uma das principais entradas de drogas no país. O município foi palco de disputas até 2023, quando o Comando Vermelho se consolidou como hegemônico;
- Santa Inês (MA): tem posição estratégica para a circulação de drogas devido às rodovias federais, além de ser palco de disputas entre as facções Bonde dos 40 e o Comando Vermelho;
- Sorriso (MT): cidade considerada estratégica para o narcotráfico devido à sua proximidade com a Bolívia, além de ser palco de disputas entre o Comando Vermelho e a Tropa do Castelar, dissidência do CV aliada ao PCC;
- Santana (AP): atua como crucial ponto de transbordo e saída internacional de drogas. A violência no município é marcada por conflitos entre as facções FTA, ligada ao PCC, e a UCA, vinculada ao CV;
- Macapá (AP): funciona como centro administrativo e ponto crucial para o crime transfronteiriço, além da violência ser causada, principalmente, pela disputa de facções e a elevada letalidade policial no município;
- Altamira (PA): município é marcado pela sobreposição de ilícitos como grilagem, desmatamento ilegal e conflitos por terra/água, além de ser palco de disputas entre o CCA (Comando Classe A), aliado ao PCC, e o Comando Vermelho;
- Itaituba (PA): considerado a “capital da lavagem do ouro”, a cidade está sob influência do Comando Vermelho, mas o CCA usa garimpos para lavagem de dinheiro e logística de drogas.
Presença de facções na Amazônia Legal
Segundo o estudo, dos 772 municípios da Amazônia Legal, 344 (44,6%) apresentam alguma evidência da presença de facções.
“A presença criminal não se distribui de forma homogênea: 258 municípios (33,4%) registram a atuação de apenas uma facção, enquanto 86 municípios (11,1%) concentram disputas entre duas ou mais organizações, indicando áreas de conflito e instabilidade social”, destacou a pesquisa.
Atualmente, o cenário amazônico abrange 17 facções ativas, com destaque, além do Comando Vermelho e do PCC, para outros grupos regionais, sendo eles:
- ADE: Amigos do Estado;
- B40: Bonde dos 40;
- PCM: Primeiro Comando do Maranhão;
- FTA: Família Terror do Amapá;
- UCA: União Criminosa do Amapá;
- CCA: Comando Classe A;
- B13: Bonde dos 13;
- Bonde dos 777 (dissidência do CV);
- Tropa do Castelar;
- Piratas do Solimões;
- Facções nordestinas, como BDM (Bonde do Maluco) e GDE (Guardiões do Estado).
No mapeamento da presença de facções na região, realizado em 2025, foi constatado que dos 344 municípios com presença dessas organizações criminosas, 286 estavam sob o comando do Comando Vermelho, presente em todos os estados da região. Veja:
Cenário atual da presença de facções na Amazônia Legal
A pesquisa mostra também que das 772 cidades, 258 são lideradas apenas por uma facção e 86 tem presença de pelo menos duas organizações.