Análise: A guerra na Ucrânia agora é problema de Trump

Vladimir Putin começou. Joe Biden não impediu. Mas, apesar de seus esforços, esta é a semana em que a invasão da Ucrânia pela Rússia se torna a guerra do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

O cargo mais poderoso do mundo nem sempre deixa escolhas. Trump é obrigado a lidar com o maior conflito na Europa desde a Segunda Guerra Mundial, porque os Estados Unidos de Biden foram o principal aliado e patrocinador da Ucrânia.

Trump poderia ter abandonado a guerra por completo. Mas, em vez disso, optou por impor a força de sua personalidade, inicialmente com a ideia de que poderia encerrar o conflito em 24 horas ou até mesmo em 100 dias.

Depois, apostou na proximidade com Putin, ecoando as narrativas do presidente russo, e, em seguida, repreendendo publicamente o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky no Salão Oval.

Trump atingiu duramente seus aliados da Otan, exigindo que pagassem mais pela defesa da Europa — e conseguiu. Mas o árduo trabalho da diplomacia entrou em colapso e rendeu poucos resultados.

Mas foi nas últimas duas semanas que Trump transformou a guerra em um problema dele. O presidente americano viu que Putin não quer a paz. Viu que a Ucrânia precisa urgentemente de armas e tentou ajudar, ainda que de forma medíocre.

Trump também fez questão de responder às ameaças nucleares, geralmente ignoradas, do ex-presidente russo Dmitry Medvedev, anunciando o deslocamento de submarinos nucleares americanos mais próximos da Rússia.

Em menos de um mês, os EUA foram de suspender a ajuda militar à Ucrânia a ameaçar o uso da força nuclear contra a Rússia.

O prazo final estipulado por Trump para que a Rússia chegue a um acordo de paz está se aproximando, e ele deve tomar a decisão mais importante do conflito até o momento. Será que ele impõe punições – tarifas secundárias contra os países compradores de energia da Rússia? Impor sanções secundárias severas à Índia e à China pode abalar o mercado global de energia. Será que ele aceita que os EUA e seus aliados enfrentem um pouco de sofrimento econômico para pressionar o Kremlin?

Trump anunciou nesta segunda-feira (4) que aumentaria as tarifas sobre a Índia porque o país estava vendendo petróleo bruto russo com lucro, sem se importar “com quantas pessoas estão sendo mortas pela Máquina de Guerra Russa”, mas o presidente não deu detalhes sobre as novas medidas.

A Índia não divulgou se pretende parar de comprar produtos energéticos russos. A China é totalmente dependente do petróleo e gás russos e simplesmente não pode se dar ao luxo de parar de comprá-los.

Para evitar outro momento “TACO” – abreviação de Trump Always Chickens Out (Trump Sempre Amarela) – Trump terá que partir para a ofensiva e provavelmente sentirá os desdobramentos.

O governo americano também pode procurar uma saída durante a visita do enviado especial Steve Witkoff a Moscou, prevista para esta semana. Trump poderia talvez aceitar um encontro bilateral com Putin como um sinal de avanço em direção à paz. Mas mesmo esse recuo ainda significaria que ele deixou sua marca na guerra.

Trump não pode ter as duas coisas. É da sua natureza buscar ser o centro de todas as decisões e o centro das atenções em qualquer situação. Cada reviravolta até agora foi baseada em suas escolhas e fantasias pessoais. E com isso vem uma lição fundamental da presidência americana.

Trump não pode escolher quais problemas são seus e quais pode ignorar. O movimento Make America Great Again defende a redução da pegada global de Washington, mas não permite que Trump seja o único responsável pelos sucessos e isento dos fracassos. A menos que Trump reduza a ação global do governo americano a zero – o que seria incompatível com sua personalidade – sempre haverá alguns problemas que são dos Estados Unidos.

Trump diz que quer que as guerras parem. Mas isso não basta por si só. Nem todas as guerras obedeceram.

O ex-presidente dos EUA, Barack Obama, herdou guerras no Iraque e no Afeganistão. Ele se esquivou rapidamente da primeira e intensificou a campanha no segundo, o que não funcionou. O Afeganistão tornou-se a guerra de Obama, embora ele tenha herdado o conflito. Trump, por sua vez, recebeu a guerra no Afeganistão e entregou uma solução rápida, que Biden foi responsável por executar. A retirada das tropas americanas do país terminou de forma caótica em agosto de 2021, sob a liderança do democrata, e foi alardeada pelos republicanos como um fracasso.

Trump enfrenta o mesmo problema após herdar a guerra da Ucrânia. Ele não pode desejar ou persuadir o fim do conflito. As próprias mortes que ele lamenta no campo de batalha semearam danos e sofrimento, transformando isso em uma guerra existencial de sobrevivência para o Kremlin e para a alma da sociedade ucraniana.

Os ucranianos querem viver em paz, sem sirenes noturnas de ataque aéreo. Putin não quer paz e, em vez disso, suas mais recentes exigências equivalem à rendição da Ucrânia.

Em última análise, isso reflete uma dura realidade: esta deve ser vista como a guerra de Trump. É o conflito que define sua presidência e a era pós-11 de setembro. Seu resultado define a segurança europeia e a beligerância chinesa na próxima década.

A China entende isso e precisa da vitória da Rússia. A Europa entende isso e está se armando para que a Rússia não veja oportunidade na fraqueza do bloco. Se Trump entende isso e aceita decisões desconfortáveis e estridentes, com as consequências que se seguem, saberemos na próxima semana.

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